A Kodak desenvolveu a câmera digital em 1975, mas o produto foi deixado de lado pela ameaça que representava ao lucrativo negócio de filmes fotográficos do qual era líder. No auge de sua história, a empresa empregava mais de 140.000 colaboradores e valia USD 28 bilhões e sua derrocada foi causada por uma tecnologia desenvolvida em suas próprias instalações pelo engenheiro Steven Sasson. Sasson criou uma câmera digital de 0,01 megapixel que pesava 3,6 kg (do tamanho de uma torradeira) e mostrou aos executivos da Kodak que recusaram a ideia por sua baixa capacidade de resolução. Preferiram se concentrar na fotografia de filme de alta resolução. Sua entrada no mercado de fotografia digital tardou e a companhia não previu a velocidade que as câmeras digitais se tornariam commodities em todo o mundo ao serem incorporadas em celulares e smartphones. A empresa ingressou em seguida no mercado de impressoras domésticas para fotografia, mas desistiu, ofereceu filmes para equipamentos de diagnóstico médico, artes gráficas e microfilmes. Vendeu patentes, demitiu e entrou em concordata Esteve sempre em busca de uma fórmula mágica para manter-se viva – quando já é tarde demais, a complacência cede lugar à busca de caminhos que ofereçam alguma esperança. Como não aproveitou a liderança que poderia adquirir com tecnologias digitais nem se livrou da tecnologia de filmes, ficou presa no meio do caminho e em constante xeque. As pessoas estão fotografando mais do que nunca, mas a Kodak não entendeu o objetivo maior que está por trás de cada foto tomada: registrar e compartilhar momentos. Quanto mais fácil, cômodo, barato e eficaz for registrar e compartilhar, melhor será. Deixou de ser uma empresa de fotografia para se tornar uma empresa de produtos químicos (filmes, sua maior fonte de receitas) perdendo foco no que estava além do resultado imediato.

Organizações com pensamento linear e construídas para estabilidade buscam conduzir transformações quando já é tarde demais, pois passam a maior parte do tempo em:

  • Foco em resultado trimestral e entendimento que o futuro será uma extensão do presente
  • Negação de novas realidades e tendências inexoráveis
  • Mentalidade de negócio bem-sucedido e que não há motivo para preocupações
  • Medição de desempenho focada em favorecer o status quo em vez de revelar o estado real dos fatos
  • Gestores muito ocupados reagindo a pendências e problemas do dia a dia sem tempo para avaliar para onde o mundo caminha
  • Colaboradores imersos em uma “bolha” de proteção
  • Falta de urgência impedindo o progresso e criação de uma situação coletiva de não ação frente às transformações necessárias

Investir em quebra de paradigma pode ir de encontro com o próprio negócio, mas muitas organizações não percebem que é necessária uma autorruptura antes que outros a provoquem. O exemplo da Kodak mostra que quando uma organização resiste a uma transformação inevitável, o cronômetro inicia a contagem regressiva para o ocaso confirmando o provérbio chinês de que há três coisas que nunca voltam atrás: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida. Contudo, oportunidades nunca são perdidas, alguém vai aproveitar o que o outro perdeu. Quando Instagram foi vendida para o Facebook valia USD 1 bilhão e empregava 13 pessoas. Ignorar tendências é como nadar contra a correnteza. “Você não viu nada ainda”, diz John Chambers em palestra no International CES 2014 ao citar que a Internet das Coisas terá nos próximos cinco a dez anos mais impacto do que a Internet já teve até hoje. Não são somente modelos tradicionais de negócio que estão sendo superados por novos modelos de negócio (e.g. EasyTaxi substituindo centrais de taxi), mas novos modelos de negócio estão sendo superados por modelos mais novos ainda (e.g. Uber substituindo taxi e, por consequência, EasyTaxi; e mais adiante carros autônomos substituindo Uber). Segmentos tradicionais de negócio tentarão deter avanços e até poderão conseguir vitórias temporárias. Mas será inútil. Não se pode deter o futuro, é melhor ir ao encontro dele.

A menos que seja para construir uma usina atômica, planos estratégicos para cinco ou dez anos perderam sentido e se converteram em peças de ficção. Não significa o fim do pensamento estratégico ou da estratégia, mas de planos criados com pensamento linear para estabelecer itens de ação de longo prazo em um mundo que se reinventa diariamente. Em tempos de mudança exponencial com fator de dobra a cada ano, daqui a cinco anos não serão cinco passos para frente, mas 32 (2x2x2x2x2 em vez de 1+1+1+1+1). Em 10 anos não serão dez passos, mas 1024. Em 30 anos, serão 1.073.741.824.

© José Davi Furlan

13/07/2015